A travessia da Petrobrás e dos preços dos combustíveis
A discussão sobre a política de preços de combustíveis, em particular da gasolina e do diesel, voltou a frequentar as primeiras páginas dos jornais do País. Os motivos foram a apresentação do novo Plano de Negócios da Petrobrás e a possibilidade de ocorrer uma redução dos preços desses dois combustíveis ainda em 2016.
No governo do Partido dos Trabalhadores (PT), em especial no primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff, ocorreu o ápice de uma política com total falta de previsibilidade e utilização dos preços da gasolina e do diesel em benefício do governo, gerando uma perda para a Petrobrás de algo em torno de US$ 40 bilhões, ou seja, um terço da dívida da empresa.
A política populista consistia em promover defasagens gigantes de preços, enganando a sociedade com fins políticos, e, ao mesmo tempo, controlar a inflação. Esse tipo de política é utilizada por países grandes produtores de petróleo e onde existe total ausência de democracia, como é o caso da Venezuela, de países africanos e do Oriente Médio.
A barbeiragem da política de preços da época foi de tal ordem que o governo, a partir de 2012, zerou a Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) incidente sobre a gasolina, transferindo dinheiro do contribuinte para o caixa da Petrobrás, prejudicando os produtores de etanol e a União, Estados e municípios com a perda de arrecadação.
A partir do fim de 2014, com a queda brutal do preço do barril de petróleo de US$ 100 para US$ 40, o governo passa a permitir que a Petrobrás se aproprie desta diferença, não transferindo esse benefício para o consumidor. Mais uma vez, adotamos uma política de preços sem nenhuma previsibilidade e sem qualquer relação com a realidade do mercado internacional.
No governo Dilma o petróleo era caro e a gasolina, barata no Brasil; agora, o petróleo é barato e a gasolina é cara aqui, para que possamos salvar a Petrobrás. No governo Dilma as distorções dos preços levaram à quebra de dois ícones: a Petrobrás e o etanol.
Agora, as distorções estão levando a um aumento das importações, gerando ganhos excessivos para importadores e promovendo um aumento da sonegação. A Petrobrás perde mercado e passa a operar as suas refinarias com capacidade ociosa. Este cenário começa a trazer preocupações ao governo e à Petrobrás e faz com que circule a notícia de redução do preço da gasolina.
Uma redução do preço da gasolina e do diesel poderia ser feita mantendo um nível de prêmio menor para a Petrobrás, reduzindo ganhos na importação e, com isso, os níveis de sonegação. O governo deveria aproveitar essa redução no preço da gasolina e aumentar o valor da Cide, em vez de ceder à tentação de se aproveitar da queda do preço para reduzir a inflação. O momento de preço baixo do barril de petróleo é o momento ideal para aumentar a Cide, viabilizando a competitividade do etanol e aumentando a arrecadação com efeito neutro sobre a inflação. Isso seria um avanço. O problema é que uma redução nos preços da gasolina e do diesel inviabiliza as metas colocadas no Plano de Negócios da Petrobrás.
Fórmula. Defendo uma política de preços baseada numa fórmula paramétrica que atualizaria os preços dos combustíveis de acordo com o câmbio e o preço do mercado internacional, e com incidência da Cide.
É bom desmistificar que fórmula paramétrica não é intervenção. Empresas como a colombiana Ecopetrol e a mexicana Pemex se utilizam de fórmulas assim. Intervenção é não ter previsibilidade.
Nos primeiros três anos, essa fórmula teria uma parcela de prêmio na venda da gasolina e do diesel para que a Petrobrás possa recuperar as perdas do passado. Neste período, o governo cria algum mecanismo que evite ganhos exacerbados com a importação de gasolina e de diesel, evitando práticas de sonegação. Passados esses três anos, retira-se da fórmula o prêmio e passa-se a funcionar seguindo o câmbio e as tendências do mercado internacional. A Cide deverá ter um valor maior quando o petróleo estiver baixo e menor quando estiver num ciclo de alta.
Da mesma forma que a Petrobrás passa por uma travessia, a política de preços dos combustíveis também precisa da sua travessia para, definitivamente, ter previsibilidade.
Adriano Pires - Diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE)
Fonte: *Artigo originalmente publicado no jornal O Estado de S. Paulo de hoje (27)