Brasil tenta angariar prestígio para a causa dos biocombustíveis na COP22
O anúncio, feito na Conferência da ONU sobre o Clima (COP22), tem 20 países signatários e aconteceu depois de dois meses de consultas a nações que se interessariam em ampliar os investimentos na produção de combustível a partir da biomassa (como os cultivos de cana para a produção do etanol e soja para a de biodiesel).
A solução ainda é recebida com receio por ambientalistas e por países que preferiram não aderir à plataforma, como a Alemanha.
Na terça (15), Barbara Hendricks, presidente da Comissão de Meio Ambiente do parlamento alemão, se reuniu na COP22 com os ministros brasileiros Blairo Maggi (Agricultura) e Sarney Filho (Meio Ambiente) para ouvir a proposta da plataforma Biofuturo. Segundo a Folha apurou com representantes brasileiros, a conversa terminou em total desentendimento.
A Alemanha –que lidera investimentos em energia solar e está desativando suas usinas de carvão– não se comprometeria com fontes energéticas que ameaçam a segurança alimentar.
O debate dos biocombustíveis ficou marcado, desde 2008, pela controvérsia da competição do uso da terra com a produção de alimentos. Na época, o Brasil já era reconhecido como privilegiado por conseguir produzir biocombustível em larga escala sem prejudicar as perspectivas da produção de alimentos –graças à cana-de-açúcar, e à quantidade de terras agricultáveis.
Agora, em vez de tentar colocar o Brasil na posição de fornecedor de etanol para o mundo, o país quer incentivar outros a produzir biocombustíveis, o que aumentaria investimentos e criaria um mercado no qual o Brasil largaria como líder.
Para ONGs internacionais, a aposta em biocombustíveis para substituição de energias fósseis ainda é polêmica. Na semana passada, a União Europeia recebeu das ONGs na COP-22 o troféu "Fóssil do Dia" devido aos planos relacionados a biocombustíveis anunciados pelo bloco.
Na proposta brasileira, o que permitiria a outros países produzirem energia a partir de biomassa seria o chamado biocombustível de segunda geração: uma tecnologia que permite a produção a partir dos resíduos de cultivos, aproveitando partes da produção que seriam antes descartadas.
Hoje, o Brasil tem potencial de produzir anualmente 5 bilhões de litros de biocombustíveis de segunda geração (e 30 bilhões de litros "convencionais"). Para bater a meta do Acordo de Paris, o país precisa chegar a 50 bilhões de litros, elevando a participação do etanol para 18% na composição da matriz energética.
Sob o argumento de que o setor de transportes, um dos que mais emitem no mundo, precisa de soluções imediatas para a transição energética; o governo parece ignorar uma tendência já em curso : a dos carros elétricos. ''Eles já contam com uma tecnologia estabelecida e é uma questão de tempo para que o preço se torne competitivo no mercado'', avalia Tasso Azevedo, coordenador do Sistema de Estimativa de Emissões de Gases Estufa do Observatório do Clima.
Segundo ele, hoje já temos 1 milhão de carros elétricos rodando pelo mundo e países planejam eletrificar toda sua frota - a Alemanha, por exemplo, quer extinguir o motor a combustão até 2040. Para Tasso, a tendência fica clara quando comparamos com a transição para o motor flex (que permite álcool e gasolina) no Brasil. ''Em uma década, a frota flex saiu do zero para representar 65% da frota circulante no país'', aponta Tasso, estimando que em 15 anos o mesmo deve acontecer com os carros elétricos.
Por outro lado, um ramo dos transportes que ainda não tem solução de baixo carbono é o da aviação civil. O Ministério de Minas e Energia deve apresentar em 2017 um plano para incentivar o desenvolvimento de biodisel para aviões. O desafio ainda é o preço, até 30% mais caro que o combustível convencional.
ANA CAROLINA AMARAL
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM MARRAKECH (MARROCOS)
Fonte: Folha de S. Paulo